quinta-feira, 29 de abril de 2010

Os tempos iam mudar!

E que bem que lhe sabia ficar em casa nesse dia! Era inesperado, bem o sabia, mas a sorte também havia de começar a mudar. Levantou-se á mesma hora de sempre, não fez a barba, quebrou desde logo a rotina, tomou o café e foi directo para o quintal. O gado chamava-o e ele, como que a querer entabular diálogo, ia falando baixinho, numa linguagem monossilábica, quase inaudível para si próprio, pensado um pouco alto, mantendo um ar de satisfação no rosto. Por um dia estava longe, livre da escravidão do relógio, da máquina de barbear, do rebuliço do dia-a-dia. Por um dia achava-se chefe de si mesmo, não tinha que dar contas senão ao… seu estômago! E estava seriamente a pensar em testá-lo! Sentia-se bem! Era o primeiro dia de “descanso” que a vida lhe estava a dar depois de tantos meses de incerteza, de medo, de ansiedade. Passado todo este tempo achava-se capaz e necessitado de se abrir com alguém, de fazer ouvir a sua voz, de dividir preocupações e acumular certezas. O Pimpolho (de que omito o nome para protecção da sua privacidade e a pedido do próprio, pimpolho este que hoje já conta mais de setenta e não é mais que o nosso interlocutor!) agarrava-se á vida com todas as forças. A mãe, idem aspas. Resta-lhe, no entanto, um pequeno senão que o atormenta: para onde terá ido o tumor gerado na mesma altura do pimpolho e no mesmo espaço alojado até determinada altura? O que o preocupa é realmente saber como desapareceu ele! E vivia nesta amargura que não o abandonava e afligia dura e severamente. Tinha medo! Medo do que poderia ter sido! Medo de ficar só! Medo de perder o gosto pela vida! Medo de mostrar aos mais chegados que… tinha medo e quais eram as razões desse medo.

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