segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

…Chovia copiosamente...

...já há dois dias. Até parecia que o céu queria desabar sobre a terra. A água corria a bom correr pela valeta em frente da casa. A primeira corrente, que recebia directamente as águas que vinham da Lagoa de Calvão e dos terrenos em redor, abraçava também as águas que, provenientes das terras da Parada corria do Marco Soalheiro e passando no Pinhal do Fojo, se lhe ia juntar nos foros. Era indício certo de cheia a curto prazo, se assim continuasse o tempo. Ainda bem que a ajuntada para limpar a vala da Sapateira já se tinha concretizado pois assim a água das chuvas escorria directamente para o Palhal e deste para a Vala Velha, permitindo que os pastos, já com uma mão travessa de altura, se agarrassem ao terreno e permitissem fartura no cedo para o gado. Estava ele sentado num banco no alpendre da casa nesta maquinação quando lhe entra pelo portão a dentro o compadre Silvério, cabisbaixo, com ar aflito e encharcado! ¬¬_ Vinde cá. Sentar-vos aqui que já falamos. E a conversa descambou para o tempo, para a caipóra que se adivinha, para as culturas, as sementeiras, o futuro e para a preocupação que trazia o compadre tão apreensivo: a ida do filho, a salto, para a França! Que tinha oito contos de reis para entregar ao passador, logo que houvesse um telefonema informando que tinham chegado e estavam bem. Era a vida. Trazia o coração aflito, apertado como um vago de milho de pipoca. Não lhe apetecia comer! Dormia pouco! Refugiava-se em orações contínuas, recitação de terço atrás de terço, muitos deles de braços abertos e alguns ajoelhado em cima de areia do mar espalhada no chão da cozinha, junto ao borralho, algumas vezes com as lágrimas a correr em bica, pelas dores não só corporais mas também psicológicas e afectivas causadas pela ausência e incerteza, acima de tudo para que Nª Senhora do Carmo acompanhasse o filho a bom porto! Ouviu aqueles desabafos dóridos do compadre, avô do seu neto, e solidarizou-se com ele afirmando que sua filha e neto, irmanados na mesma dor, assim estavam a proceder. O rapaz havia de singrar, arranjar vida e mandar chamar, para junto de si, a mulher e o filho e aí sim, aí é que o sofrimento se lhe iria agudizar, pois levar-lhe-ia a alegria de sua casa!

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