Angustiado!
Prova o saber amargo da água com sal
diluído que brota das fontes da alma sem motivo aparente.
Na verdade há vinte que entrou nos entas e
embora lhe não faltem forças nem vontade sente que a envolvência se encontra
cansada da presença tão assídua.
Meio século e dez!
Que fez? Porque está ainda aqui? Diz bem
alto que não fez tudo o que quis, mas quis muito a tudo o que fez!
E se fosse hoje o início?
Pára absorto nesta cogitação esquisita que
parece querer incomodá-lo. Nada do passado o incomoda mas começa a ficar
apreensivo relativamente ao futuro.
Mas é claro que com esta idade ainda tem
projetos. Projetos e garras de continuar a sonhar. Apetece-lhe gritar que há
quarenta que está nos vinte! (!!!) Tal a ânsia que tem de viver, de se realizar
pessoal e socialmente. Não se sente cansado. O corpo ainda não se queixa de
eventuais maus tratos que lhe tenha infligindo. Os achaques que se vão
manifestando vão-no ensinando a dar a volta e, sem desânimo, muitas das vezes
recuar para apanhar balanço e dar o salto. Assim tem sido durante os últimos
tempos. Nunca soube o que era vida fácil nem tão pouco facilitada! Com pouco
farelo tem feito as papas que o veem alimentando e aos seus. Ainda não deu para
provar a boa farinha. Calhando será esse o objectivo a atingir: A curto? A
médio? A longo prazo? O tempo o dirá!
E aqui começa realmente a sua preocupação.
Que lhe reservará o futuro? Ainda bem que o não sabe. Assim vive intensamente
cada dia como se não houvesse mais fim, deste tirando proveito total e tornando
cada segundo único e irrepetível. Vendo as coisas de outra forma, que terá ele
feito para merecer a felicidade que o invade e inunda? A quem serviu e com que
forças? Terá feito tudo o que estava ao seu alcance? Que merecimentos serão
estes que se concretizam nesta alegria constante e forte vontade de viver mesmo
tendo quase a certeza de já não ter outro tanto tempo para viver e usufruir
deste mundo?
Sessenta anos de vida. Tantos
acontecimentos e voltas dadas pela sociedade. Tanta gente com quem viveu e
conviveu. Tanta gente de quem se recorda com alegria e saudade!
Tristeza ou ausência de alegria? Doença ou
ausência de saúde e bem-estar? Pobreza ou ausência de riqueza? Vazio ou
ausência de recheio? Isolamento ou ausência de amor e diálogo? Mentira ou
ausência de verdade? Morte ou ausência de vida? Desinteresse ou falta de
capacidade para querer e fazer? Ausência ou isolamento voluntário e desânimo
associado à falta de objectivos? Falta de objectivos ou desinteresse pela vida?
Desinteresse pela vida ou falta de objectivos concretizáveis? Obstáculos
constantes ou ausência de trampolins? Negativismo ou desconhecimento da
realidade?
Não desperdiça. Nunca desperdiçou o que
sabe! Transmite-o para se perpetuar. O mesmo faz ao seu tempo: vive-o para o
apreciar! Há direitos e deveres. Sempre optou e cultivou os segundos mesmo
abdicando dos primeiros, pois a felicidade plena insere-se no grupo dos
segundos. Ninguém tem o direito de ser feliz: Todos temos o dever consagrado de
ser e fazer felizes os outros!
Sem comentários:
Enviar um comentário