… apeteceu-me
mandar-te um recado para que te predispusesses a ir a um encontro comigo! Mas
os meios e oportunidades que surgiram nunca eram os mais fiáveis e oportunos. Enreguei
a considerar seriamente começar a viver este romance à chocha calada, nem
sequer com os meus botões me abrindo.
Sonhava contigo todas as noites!
Dava
comigo, durante o dia, andando no trabalho que andasse, embebecido e com um
pálido sorriso, olhando fixamente a tua imagem, no vazio, sem pestanejar, como
se fosse real e estivesses ali à minha frente.
Por mero acaso e
quando menos esperava, mesmo correndo o risco de por outros ser visto, ousei
depositar um beijo nas costas da tua mão! Mão que olhaste! Mão que olhaste e
retiraste bruscamente da minha e meus lábios! Sorriste franca e timidamente
mas… nada disseste! A conversa terminou assim e cada um se dirigiu para o
trabalho que andava a fazer, cumprindo a missão que lhe estava destinada.
Triste sina…
… Aquele abraço que
me deste… ninguém ocupa o teu lugar no meu coração! Sinto-me realizado e ao
mesmo tempo, meio sem jeito. Só me apetece estar junto a ti. O teu olhar
simples, franco, aberto, sincero… a tua forma de falar, de dizer as coisas… a
sonoridade jovial das tuas gargalhadas… a melodia com que as palavras fluem da
tua boca… como gostaria de decifrar o que na verdade querem dizer quando as
pronuncias!
Apetece-me… fugir de ti! Sim! Penso que a
todo o momento deixarei de ser livre e abraçarei deliberadamente a mais feroz,
recôndita e escura clausura! Se não for correspondido nos sentimentos que por
ti nutro abandonarei tudo! Sairei por aí fora, vagabundeando ao Deus dará até
que a ferida aberta cicatrize e o projecto sonhado se dissipe no tempo e se
esvaia da mente que para ti me puxa!
Sempre que nos encontramos abraçamo-nos de
forma espontânea, agradável e desejada. Falamos de nada! Sim, entoamos sons
parecidos com palavras, que terão sentido para quem nos rodeia e ouve mas não
para nós que as pronunciamos respeitando o tempo de falar um do outo!
Cruzamos olhares, pouco tempo perdendo
frente a frente e suave e ligeiramente, voltamos a cabeça! Mas… os olhos ali
ficam parados, recusando obter outra imagem que não seja o teu rosto num todo,
as tuas faces rosadas, os teus lábios ternurentos, os teus dentes alvos e
sempre, mas sempre mesmo, a sonoridade desejada e agradável das tuas
gargalhadas!
Os toques fortuitos, mas deliberados nas
mãos, tentam transmitir sentimentos, substituindo outras atitudes e frases que
ficam por fazer e dizer, quiçá mesmo um beijo fugidio, arfante e desejante de
algo mais que pura e sincera amizade! Nascemos no mesmo tempo, fomos criados
quase sem nos conhecermos, vivemos gozando os prazeres possíveis e, enfrentando
deslizes, tememos o futuro! Inesperadamente, em momento proporcionado pelo
destino, ficámos frente a frente! Nada fomos capazes de dizer! Olhámo-nos
francamente uns segundos que pareceram uma eternidade que desapareceu
inesperada e mais rapidamente do que apareceu! Fugiste para longe. Colocaram
entre nós uma imensa estrema separadora, cheia de água salgada…
Quis o destino que o mal de alguns viesse
fazer com que um ténue laço se mantivesse à tona da água desse imenso vau que
nos separava e a que chamam Atlântico!
Naquela carta que escreveste, a pedido de
teu pai e dirigida ao amigo Manel, atreveste-te a colocar, como final de tudo e
antes de fechar o envelope, “Manuel, se quiseres podes escrever-me”, sabias já
de antemão que era eu quem lia e escrevia as cartas a muita gente que não sabia
ler nem escrever e de quem seus entes queridos, como tu, se tinham ausentado do
torrão natalício…