…
Olha que eu falei em
casar e a primeira coisa que o meu pai me disse foi “quem casa quer casa,
portanto, trata lá de falar com ela e digam onde querem erguer o vosso lar pois
ajudar-vos isso vamos mas interferir, não contem connosco”! Mas espera aí. Quem
é a cachopa?
Lá fui obrigado a abrir o livro dos segredos e deixá-lo ler algumas páginas.
-Tu não me digas que
andas de namoro coa filha do Castelhano. Tu toma tento nessa cabeça. Aquilo é
gente de respeito e nós também somos dados a ele.
-Então fique a saber
que sexta-feira à noitinha, vamos lá a casa deles que eu quero pedir a Maria em
casamento. Já falei com ela e estamos de acordo.
Desde essa conversa o
Ti Manel tudo fez para se encontrar com o Castelhano em ponto de poder tocar no
assunto, mas nunca surgiu oportunidade para tal.
No dia aprazado,
dadas as voltas em casa, Ti Manel, mulher e filho, vestidos mais
adonairadamente, dirigiram-se a casa do Castelhano, tentando fazer o percurso
por caminhos que dessem menos nas vistas pois não queriam dar a conhecer as
intenções.
Já a Maria, o pai e a
mãe estavam como que a fazer tempo, com tudo pronto, voltas dadas, panela ao
lume, mesa posta, à espera de tão ilustres personagens. Que raio, iriam ser
compadres pois os filhos iriam casar!
Feitos os cumprimentos da ocasião e enquanto os homens se dirigiram à adega provar um parreirol, as mulheres, timidamente meteram-se com a cachopa a tentar tirar nabos da púcara, para saber se já tinha acontecido alguma coisa ou se o namoro era sério e como convém a gente honrada.
A rapariga, corada, descansou-as, dizendo que nada
fizeram que não pudessem ter feito na frente fosse de quem fosse, mas que não
tinham querido namorar à frente de toda a gente. Queriam conhecer-se e falar do
amanhã em comum. Queriam dar os passos certos no tempo certo.
Chegados os homens, o
Ti Castelhano convidou para a mesa, pediu ao “Parceiro” que se sentasse ao seu
lado e os “Cachopos” na outra ponta da mesa. As mulheres sentar-se-iam onde
quisessem…
Panela na mesa,
picheira de parreirol a vazar-se bem, de tudo falaram, menos de casamentos! Até
que que, Manel e Maria, pedindo licença aos pais, deram a conhecer as suas
intenções e que gostavam de saber as opiniões deles.
Concordaram com o
casamento, claro, e logo ali deram início à conversa acerca do dote que poderiam
dar-lhe.
> Ti Castelhano, brioso,
enaltece e oferece: A minha cachopa levas as baleiras para assentamento! “Olhar
que naquilo muitos queriam por a mão, mas cedo decidi que seriam dela. Aquilo é
coisa asseada!
> Assim sendo o meu rapaz leva
madeira rija, dos pinheiros do Samoical, para serrar e aparelhar pró que for
preciso;
> A minha Maria leva atão o
rego dágua, terra forte e boa embora esteja dividida pela vala que ali escorre…
> Falei ca Comadre e também
vamos deixar que ele fique com a Pichota, que embora seja pequena, tem um bom
poço;
> O
meu pai, a mangar ou a sério, já aqui há tempos lhe pôs á disposição a borda
das olarias. Nunca foram exploradas e tem areia de primeira qualidade e espaço
suficiente para fazer o barreiro;
Havemos de ir à cal.
Temos os Fornos, o Barracão, O Zambuzal. A do Barracão parece que estala muito…
E o mais se há-de
arranjar. Eles já não vão para novos. Ele com 30 e ela com 24 já é idade para
se saber o que se quer.
Dum lado e de outro,
havia mais irmãos em casa, todos mais novos. Eram eles, lado a lado, quem iria
“encertar” os ranchos daquelas famílias. O pai fazia pão com a graça de Deus e
o sogro seguia-lhe o rasto. Tanto uns como outros tinham o seu moliceiro,
arrimado aos moirões no Cais do Areão! Certo e sabido que o moliço estava
garantido para o adubar das terras, assim a Ria o criasse nos seus longos
braços, pois os recantos onde ele era mais graúdo não lhe eram desconhecidos.
Cada um tinha a sua Junta e ao lado, duas vacas leiteiras que anualmente davam
cada uma sua cria, certinhas tanto no leite como nestas. Aquilo eram autênticos
colchões …
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